Sinestesia
la luna - 23jul002
Tivera sempre uma vida sinestésica.
Era sinestésica a forma
de entender a vida.
A infância fora visual, da adolescência recordava
cheiros, mas a juventude... Ah, a juventude fora o crescente das sensações, o mergulho no entender pelo sentir, aspirar, sorver,
enxergar!
Havia aquela colega da qual não conseguia lembrar o nome,porque tinha cara de buldogue, aquela outra, de passarinho, o professor, que parecia gravura de Jesus menino e outro que lhe
lembrava um contador, mas aquele - o Lord inglês - Ah, aquele tinha um mistério que não se podia alcançar.
Nunca havia imaginado que o mar pudesse ser retido em um par de íris, que o céu ficasse preso, refém mesmo de um olhar! Mas teve
esta absoluta e extasiante certeza naquela manhã fria e preguiçosa e carregou este conhecimento por toda a vida, sem jamais voltar a
presenciar o fato, a não ser quando avistava o tal moço que nos dias frios usava um pulôver branco.
Uma brancura de neve, uma alvura de ferir os olhos, tão demasiadamente branco que forçoso era erguer o olhar e descansá-lo na
imensidão azul-esverdeada que pairava inconteste acima do agasalho. E aquela duas tranças simétricas,paralelas, verticais? Pareciam duas
pontes, colunas que ligavam a imensidão de um céu marítimo à terra firme, ao chão. E se por acaso o pensamento voava em desvario, podia se ter certeza que do pulôver elas fugiam e enlaçavam quem as olhava,afogando,submergindo.
E as tardes eram rosa. E o tom pela noite se estendia e o céu de estrelas bordadas cancelava qualquer prenúncio de dia.
E isto acontecia sempre que uns olhos de fim de tarde sua cabeça recostavam
naquela alvura macia.
Olhos de fim de tarde, cabelos de sedosos fios, eram pequenas manchas de mel na alvura do frio, e sobre aquela imensidão do celeste
mar, fulvos raios luziam.
Mas o vento soprava sempre, carregando as folhas, secando as roupas, trocando as cores da vida. E o pulôver estendido no varal,
dobrado no banco das lembranças, ia esgarçando os fios.
A roda do tempo girava e se sucediam os dias, as imensidões ficaram turvas mas não perderam o desafio. O fulvo tornou-se gris e
outro, não Aznavour, cantava "She", mas o coração persistia e ainda
batia no compasso "He".
Toda a tempestade tem bonança e a tarde ainda incendeia.
A imensidão verde-azulada de estrela ainda ponteia quando os ventos da lembrança sopram as areias e duas tranças de um níveo pulôver
convidam para a contradança. Esperanças? talvez!
7 de out. de 2005
10set002
Os dias tem começado estranhamente frios. Nuvens
repletas de chuva guardada passeiam pelo céu matinal
enquanto o sol tímido titubeia em sair.
Penso que inadvertidamente a primavera esqueceu-
se de voltar. Quem sabe trocou de turno com o inverno???
O Flamboyant a minha frente oferece as derradeiras
flores da ultima florada e nos galhos nus, brotos
indecisos começam a aparecer.
Um vento frio e cortante tem varrido a rua ,
todos os dias pela manhã. Enquanto cruzo as calçadas,
observo os jovens que passam para a escola, as mães -
excessivamente zelosas - no cumprimento do diário banho
de sol de seus bebes, os trabalhadores chegando para a
faina costumeira...Todos expressam nas roupas e nos
rostos a falta de calor que a ausência do sol nos
traz...Alguns corajosos, ou talvez preguiçosos de
carregar, passam sem agasalho!
Na padaria, homens sentados esperam o café da
manhã. Média fumegante e pão quente. Sanduíche de
esperanças coalhado nos olhares perdidos que vagueiam
pelas ruas.
Raios tímidos, de um sol mais tímido ainda,
brincam de aparecer entre nuvens... Os pardais cantam
docemente como a incentivar o surgimento do calor
matinal.
O frio corta seco, a pele , a alma.
Uma solidão pungente , feita de concreto , aço e
arvores nuas habita meus olhos!
Cadê a primavera? Não voltará jamais !?
Será???
28 out 2002
Belo está meu pais
De vermelho enlaçado
Nossos corações
Em bandeiras desfraldadas
Vermelho sangue brasil,
Nas terras, pelos irmãos derramado
Vermelha terra do solo
Vermelho é o meu cerrado
Vermelha a aurora nasce
O sol ferindo a barra
Vermelha esperança
O albor da estrela dalva
Vermelho sol poente
Quando a noite se adentra
E em paixão morre o sol,
No ocaso, lentamente
Vermelho da esperança
Do meu sangue latejante
A nação se agigantando
O medo não sobrepujou a esperança!