26 de jul. de 2009

São Paulo





O dia escorrega lentamente pela barra de um horizonte que não se avista. O campanário da Sé toca o ângelus, o órgão de tubo encena a Ave Maria enquanto devotos, ajoelhados, repetem o terço.

Os postes se acendem lentamente, olhos que se abrem após um longo sono, derramando sua luz amarelada sobre as palmeiras imperiais e da escadaria se tem a certeza de estar num portal de magia...

Não posso me demorar mais e desço, suavemente, os muitos degraus enquanto volto ao mundo real. Do lado esquerdo o açougue oferece alcatra a R$ 8,99 e o rapaz da paçoca apregoa dez unidades a um real.

Caminho para a parada de ônibus. Aqui as pessoas amontoam-se de pé, num esforço engraçado para ver os letreiros. Na cidade da fila, os ônibus não esperam a sua vez ou seriam as pessoas aflitas demais para aguardar? Não sei.

O prédio da “Estadual” se ergue imponente, mas deveria estar do outro lado da rua e não aqui onde o mundo é real e palpável.

A Paulista se abre aos meus olhos com seus contrates entre o absolutamente novo e o completamente clássico: a FIESP e a Casa das Rosas; industria e poesia, atual e antigo.

São Paulo me recebe no Paraíso das suas construções díspares, na beleza de sua cosmocidade: o templo budista e o hotel Unique com sua forma de navio ancorado em plena Av. Brigadeiro Luiz Antonio; a Catedral Metropolitana Ortodoxa e o MASP, a imponência dos tribunais e a simplicidade das praças circundantes onde um sem número de pessoas dos mais diversos credos e raças se misturam na azáfama do dia-a-dia.

Eu, provinciana da Capital Federal, sou um vírus na corrente sanguínea da Cidade que nunca dorme. São Paulo me abraça e me recebe nos seus jardins das diversas praças existentes. Jardins diferentes dos que conheço, mas igualmente belos.

Tantos anos se passaram desde que pisei pela primeira vez na terra santa dos Barões do Café e meus olhos de menina ainda são os mesmos: plenos de uma admiração que sempre se renova!

4 de jul. de 2009

Alice no Pais das Maravilhas




Alice no País das Maravilhas

Thamar

A fruta tocou a língua, e o sabor da infância disparou imagens, saudades, aromas... Manga rosa, manga doce, manga dos tempos distantes, das tardes amenas com sabor de amor, amor de rosa-mãe.

Manga chupada no pé, com casca e tudo. Manga descascada, cortada em fatias douradas, dançando no prato sobre a janela da fazenda e minha avó com seu sorriso de paz, seus cabelos brancos, seu vestido preto e o imenso amor, amor-manga, embalando o tempo.

“Quem é você?” A pergunta feita pela lagarta a Alice ressoa no tempo e volta no vento cheia dos odores daquelas tardes perfumadas pelo cheiro do campo, onde alfenins dourados chegavam na ponta dos dedos das fadas.

Alice no país das maravilhas, protegida pelo amor das Fadas, Elfos e povo pequeno, digeriu as transformações sofridas e encontros inusitados com a perda e a vida real, os círculos sociais próximos, nunca tão próximos que fossem compreensíveis, a escola, as atividades cotidianas. Suas respostas sempre erradas, sucessivamente perfumadas pelas mangas-rosa suculentas, oliveiras e pitangas, lírios do campo e rodas ao luar.

O mês de maio e os terços sob a lua prata, os terreiros de areia branca e o atabaque soando ao fundo, muito longe, na terra de homens negros, turbantes brilhantes, do outro lado do mundo, um mundo distante chamado áfrica.

O livro de orações e os retratos 3X4 guardados dentro, pedindo especial proteção. A lua entrando pela telha de vidro, o rádio pequeno, azul, de pilha, tocando até o sono chegar. Casa de farinha de brinquedo, travesseiros rodando nos pino da cama e a fada voando de flor em flor, cantando um acalanto, palavras de amor.

Alice não mais no país das maravilhas, Alice no mundo real e a fada, assim como a Avalon de Morgana, sumindo entre a neblina. Seus passos a cada dia mais lentos, confundindo-se na névoa do tempo.

Minha fada pequenina, hoje minha menina, há tempos atrás minha heroína.

Minha fada se dissolvendo nas brumas e eu a cada dia menos eu e mais Alice no país dos espelhos não tenho sua ajuda para correr da Rainha que grita: cortem-lhe a cabeça, cortem-lhe a cabeça...