21 de set. de 2006


Querido irmão de minha alma,

Sentada sob as estrelas deixo que o vento acaricie meu rosto, minha pele, meus cabelos... O ar tem cheiro de chuva, prenunciando que o calor logo ficará mais suportável, embora as estrelas desmintam a notícia.

A terra recende a mulher feliz. Fragrância molhada, fecunda, plena de realizações. A rua está cheia de folhas secas que caíram na última passagem do vento, quando ele brincou de currupira com as copas altas.

Li suas letras brilhantes, seu texto rápido, conciso, cheio de vigor e verdade.

Fiquei com saudade dos tempos em que gastávamos horas do nosso tempo em intermináveis conversas. Sobre o que mesmo conversávamos? Sobre política celeste, filosofia, educação, amor, sexo, vida... E o tempo passava sem que percebêssemos, sem que sentíssemos, num exercício de trocas sempre renovadas.

Sentávamos sob o carvalho da madrugada e a lua iluminava nossa escrita pelas linhas do céu. Bordávamos de estrelas os textos que sempre atravessavam o firmamento para encontrar o sol na barra do dia!

Ainda sinto o cheiro das manhãs florescendo, enquanto sua cabeça repousava no meu colo e as palavras passeavam pelos céus de nossas bocas...

Li suas palavras brilhantes e minha alma se encheu de orgulho por ser sua amiga e partilhar com você lembranças de momentos especiais, aromas de chocolates e noites repletas de palavras perfumadas.

Li você e a saudade veio sentar-se a meu lado!

12 de set. de 2006







Haja o que houver
Madredeus

Haja o que houver, eu estou aqui
Haja o que houver, espero por ti

Volta no vento o meu amor
Volta depressa, por favor

Eu sei, eu sei
Quem es para mim
Haja o que houver
Espero por ti

Há quanto tempo já esqueci
Porque fiquei longe de ti

Cada momento é pior
Volta no vento por favor

11 de set. de 2006




Reflexões ao por-do-sol
Thamar
set/2005

O mês de Elul traz consigo um sol vermelho ao final da tarde. Sua beleza intensifica-se a medida em que uma névoa seca produz uma sensação de embaciamento da vista possibilitando olhar fixamente o disco fulgente que incendeia a barra do horizonte.

Será essa a razão deste mês ser chamado de mês das luzes? sinceramente não sei, mas deveria ser! O espetáculo é belíssimo embora poucos se dêem ao trabalho de apreciar. Em algum outro lugar, esse mesmo sol, desce a barra do horizonte enquanto seu reflexo passeia pelas águas do oceano, traçando um reflexo de dourada prata nas águas salgadas... Coisas maravilhosas que o homem perde de observar todos os dias!

Perdemos tantas coisas, deixamos de apreciar tantas belezas que gratuitamente a vida nos oferece, a cada dia, presos que ficamos em convenções de dever ser como se devêssemos ser algo mais que felizes...

Tomo meu baú de penduricalhos e resolvo organizar minhas lembranças. Suas cartas, amarradas com fita cor-de-rosa sol de Elul, repousam no lado esquerdo do baú. Acaricio-as como se fossem sua própria face, abro-as , uma-a-uma, e lhe escuto pronunciar cada palavra pensando ser capaz de adivinhar as inflexões, os sorrisos suspensos, o brilho astuto do olhar , a expectativa da espera.

quanto tempo nos correspondemos? Mais de ano, dizem as cartas e sei que não tenho todas, algumas rasguei por uma pueril noção de perigo, como se houvesse jeito de se viver sem estar em perigo!

Um vento morno sopra nesse final de tarde e um calor intenso e interno me abrasa: Sinto sua falta, uma falta forte, ardente como o final da tarde. As palavras reacendem a lembrança do toque, do abraço... Seu cheiro puro, sem misturas químicas, seu porte, sua elegância, sua beleza quase helênica...

Lembro de uma “modinha”em que o cantor perguntava: “Por quem sonha Ana Maria?” Sinceramente eu não sei por quem ela sonha, mas espero que sonhe com alguém e que esse alguém tenha um rosto, um cheiro e um corpo porque os sonhos abstratos doem demais, bem sei eu.

Meu sonho tem um rosto, um toque e um cheiro específico e, agora sei, um desejo contido por muitos anos, um querer antigo sempre considerado inatingível ou eu não teria pequenos papéis guardados e lembranças tão fortes de cheiros, roupas, fatos, curiosidades. Depois de tantos e tantos acontecimentos a permear a memória, ainda ressoa o conselho só colocado em prática na sua companhia:

(..)Se um dia encontrar alguém que lhe respeite e que queira compartilhar com a senhora o seu carinho, aceite porque carinho e respeito são matérias muito escassas na humanidade!

Minha saudade tem um toque de pétalas de rosas e a segurança do melhor abraço já experimentado, tem a intensidade de um grito de guerra e a vontade sempre impossível de ficar um pouco mais. É feita da certeza de que a não proximidade excessiva popa nossos olhos de cegaram a luz dos nossos recíprocos defeitos, e assim seguimos unidos pelo desejo que a distancia aumenta e a saudade regula embalando meus sonhos e colorindo meus dias com sua palheta de arco-íris (e eu já tão acostumada com o cinza, sinto-me deslumbrada!).

O sol já se escondeu e Amelita Baltar me conta, em sua belíssima interpretação, que sus labios de fuego otra vez quiero besar[1]enquanto eu lhe sugiro:

Quereme así, piantao, piantao, piantao...Trepáte a esta ternura de locos que hay en mí, ponete esta peluca de alondras, ¡y volá! ¡Volá conmigo ya! ¡Vení, volá, vení![2]



[1] Por una cabeza – tango de Gardel e Le Perra

[2] Balada por un loco – tango de Piazzola e Ferrer

4 de set. de 2006

Desejos

Queria poder levar um raio de sol e a suave fragrância que impregna o vento;

A vida pulsante a cada momento nesta cidade sempre maravilhosa...

Levar as casas que sobem a encosta, a passarela cor-de-rosa e o trem azul no seu vôo solo!

A placidez do aterro e o burburinho do Saara, a imensidão que do bondinho se descortina e os meus olhos de menina...

Queria saber falar da beleza abobadada, dos monumentos, das colunas,dos sentimentos que dormitam na arquitetura centenária.

Levo então minha’lma alargada, olhos deslumbrados que ainda mais me ligam a D’us.

Levo a plenitude da saudade bordada com a beleza que entrevejo na cidade